domingo, 29 de dezembro de 2024

A FORMA DE TRABALHO NA THATGAMECOMPANY

 

Por: Lothloriana

“O processo criativo democrático, não autoritário.”

Recentemente publiquei dados gerais e públicos da TGC, mostrando o que ela é por fora daquelas portas de vidro. Em entrevistas recentes à portais chineses, podemos ter um vislumbre do que há ali dentro por meio das palavras do diretor criativo e CEO, Jenova Chen.

O pensamento do CEO é proteger os ideais iniciais da empresa. “Como a cultura da nossa empresa é muito diferente da de uma empresa de jogos AAA, eu a aprecio assim. Mas se um dia a empresa ter que se tornar centenas, milhares de pessoas, como podemos proteger essa intenção original?”

De acordo com o site da equipe da empresa, bem como seu Linkedin, a grande e ousada [pretenciosa?] missão da TGC é criar entretenimento atemporal que cause mudanças positivas na psique humana em todo o mundo. Ela espera mudar a indústria de videogames com esse processo, para que outras empresas abordem os videogames como um "meio criativo" em vez de um produto de massa. JC não pretende que a TGC faça "jogos de grande orçamento e sucesso de bilheteria", pois acredita que a pressão financeira sufocaria a inovação. Eles querem elevar os jogos como uma forma legítima de arte e criar jogos verdadeiramente inovadores por meio de experimentação, colaboração e perfeição.

Entrevistador: Ouvi dizer que depois que você conseguiu o investimento necessário para a TGC, você também foi ao fundador da Pixar Animation para ser consultor.

JC: O desenvolvimento do Sky foi uma luta, mas sua visão se encaixou com os investidores, que ofereceram US$ 160 milhões em capital de risco, com o cofundador da Pixar, Edwin Catmull.

Chen diz que seu discurso para os financiadores foi simples: os jogos são feitos principalmente para os interesses estereotipados dos meninos, e alguém precisa começar a fazer jogos de "quatro quadrantes" que atraem meninos, meninas, homens e mulheres ao mesmo tempo.

Com isso em mente, Jenova Chen diz: "Olhe para a Pixar. Por que uma empresa como essa não existe na indústria de jogos? Eu quero fazer esse sucesso comercial. Mesmo que não seja eu quem acabe me tornando aquela Pixar, alguém vai fundá-la no futuro.”

Entrevistador: Então você quer que a empresa seja mais "Pixar"?

JC: Sim. Acho que o heroísmo individual tende a tornar a cultura da empresa muito tóxica. Dessa forma, grande parte da energia de todos não estará focada no projeto.

Esse “heroísmo individual” faz parte de uma cultura de trabalho muito visto, e que em produções audiovisuais é comumente representado pelas animações da Disney, no qual vemos o protagonista passar pela chamada Jornada do Herói, seus méritos são individuais, o que voltado ao ambiente de trabalho pode gerar competição e mal-estar.

JC: A Pixar e a Disney têm culturas diferentes. A Disney presta atenção ao heroísmo pessoal, e todos estão se exibindo, provando que este filme é bom por minha causa, e pessoas realmente boas podem ganhar muito dinheiro. Mas entre as pessoas, muitas vezes é uma relação competitiva, porque ajudar os outros significa apenas aumentar o bônus da outra parte.

Mas na Pixar, todos estão ajudando uns aos outros “se você não puder fazer isso, eu vou ajudá-lo”, e ajudar os outros também contará como parte do desempenho.

Sobre o que Jenova Chen está falando?

A Pixar Animation Studios, comumente conhecida como Pixar, é uma empresa líder de animação, este estúdio icônico tornou-se célebre por produzir filmes de animação aclamados pela crítica e de alta bilheteria, como "Toy Story", "Procurando Nemo", "Os Incríveis" e "Divertida Mente". A Pixar consolidou sua posição como pioneira na indústria cinematográfica de imagens geradas por computador (CGI). Fundada em 1986 com apoio significativo do cofundador da Apple Inc., Steve Jobs. Adquirido pela Disney em 2006 por US$ 7,4 bilhões.

Foi criada e é presidida por Edwin (Ed) Catmull, que atualmente também preside Walt Disney Animation Studios e LucasFilm, estúdio da franquia Star Wars. Ed escreveu um livro chamado Creativity Inc., sobre como manter a cultura criativa da Pixar e, por tantos anos. Neste livro, Ed apresenta a metodologia Braintrust (cérebro de confiança), que surgiu de forma espontânea e se tornou essencial para o processo criativo dos filmes da Pixar. É como uma reunião de brainstorm (reunião de desenvolvimento de ideias coletivas) diferenciado.

De acordo com Ed, nessa organização “todos estão totalmente empenhados em ajudar os outros a fazer o melhor trabalho”.

Além disso, Ed Catmull elencou 3 pilares responsáveis pelo sucesso da gestão de inovação da Pixar em encantar clientes: Foco nas pessoas, depois nas ideias; Criação de uma cultura interativa entre as pessoas; Definir seu estilo de liderança e coordenar junto à equipe.

Como resultado, sua organização ganhará uma equipe alinhada, engajamento com as ações internas e externas, além do orgulho em fazer parte do seu time. Em última análise, seu objetivo é tornar o processo criativo democrático, não autoritário.

Como funciona o Braintrust?

O Braintrust é uma sessão síncrona (ao vivo e preferencialmente presencial) com um grupo de pessoas de diferentes hierarquias e grupos da empresa, que se reúne periodicamente para discutir ideias e dar feedback umas às outras, e busca melhorar o trabalho em equipe e, consequentemente, a qualidade dos projetos. Afinal, trabalhar com criatividade exige muito mais do que o operacional, mas também, novas experiências, vivências, feedbacks e confiança. As reuniões se baseiam apenas em sugestões, ou seja, o profissional pode ou não aceitar as opiniões. O Braintrust exige maturidade, humildade e empatia. É a técnica do feedback aplicada na sua forma mais elevada.

Os princípios do Braintrust:

  • Todos estão no mesmo barco: todos compartilham a mesma paixão e interesse pelo projeto
  • Honestidade brutal: todos são encorajados a dar feedback honesto e crítico, sem medo de ofender ou ser ofendido
  • Foco no objetivo: o objetivo final é o melhor resultado para o projeto, e não o ego, em parecer bem para os chefes, ou a opinião de cada indivíduo
  • Sem hierarquia ou autoridades: a pessoa apresentando não precisa seguir nenhuma das sugestões específicas dadas. Cabe a ela descobrir como lidar com o feedback.

Todas as etapas do processo de produção são valorizadas dentro da Pixar. As equipes criativas e de tecnologia são simplesmente não é permitido aperfeiçoar ideias antes de compartilhá-las. A colaboração é fundamental e permite que a Pixar faça decisões mais rápidas, experimentando ideias antes de passar para a próxima. Os funcionários devem se sentir confortáveis com a perspectiva de sua ideia ser descartada ou desenvolvida. Igualmente, depois de cada filme, as equipes se reúnem para fazer um 'brain dump', discutindo quais áreas podem ser melhoradas e quais funcionaram bem. Esse tipo de autoanálise e crítica aberta leva a Pixar a continuar se desenvolvendo. E uma grande proporção dos recursos da Pixar é colocada no bem-estar e desenvolvimento de sua equipe.

Voltando às entrevistas dadas por Jenova Chen sobre o funcionamento da TGC.

Entrevistador: Mas muitas grandes empresas incentivam as “corridas de cavalos” e a competição interna.

JC: O problema central é que, depois que o crescimento de uma grande empresa é muito rápido, as pessoas da equipe não estão altamente conscientes o suficiente e não estão dispostas a fazer as coisas sem incentivos. Mas as pequenas empresas são diferentes, e aqueles que estão dispostos a ir para novos territórios são, na verdade, pessoas altamente conscientes. Steve Jobs disse que se você contratar uma pessoa medíocre, quando ela entrar na gerência, ela só contratará pessoas piores do que ele, e toda a empresa acabará com um nível baixo. Portanto, na Pixar, incluindo a Apple, há uma regra não escrita: a empresa não pode crescer muito e a equipe principal deve ter menos de 100 pessoas. Até hoje, o número de pessoas na animação da Pixar não ultrapassou 2000 e o Steam não ultrapassou 300. E éramos apenas 160.

Entrevistador: Que insights importantes você aprendeu [com Ed Catmull]?

JC: Ed me disse que havia um dos veteranos mais experientes em sua empresa, John Lasseter, e que os jovens não se atreveriam a fazer nada com ele. Mas se os jovens não falarem o tempo todo, a cultura da empresa mudará. Portanto, eles tinham uma regra não escrita de que John não deveria ter permissão para falar 15 minutos antes de cada reunião. Muitos dos novos estagiários são realmente muito atenciosos, e a Pixar também providencia para que eles participem de algumas reuniões.

Então...

Resumindo o que sabemos sobre a TGC:

  • Prezam pela experimentação e a liberdade da arte acima de crescimento. Pensando nisso sua técnica de produção criativa é de Braintrust;
  • Visam manter a tradição junto à inovação, [como é o lema do mercado Chinês] e com isso segue tentando manter o menor número de funcionários.

Não estamos tão por dentro da TGC para saber como são aplicados, de fato, os métodos da Pixar. Mas podemos ver os resultados. Por mais que a empresa traga inovação e esteja conseguindo se estabelecer bem no mercado, com bons lucros, como já falado em outro post, é interessante pensar o que poderia dar ou estar dando errado. Algum tempo atrás, no Reddit, foi exposta uma avaliação de um ex-funcionário da empresa, e então eu sugiro você relembrar como Ed Catmull descreve seus 3 pilares de organização e como funciona o Braintrust. É apenas um ponto de vista, mas que casa com a realidade dos resultados que vemos do lado de fora, bem como as ideias Pixar.




Observação sobre o Conselhos à Gestão: A expressão C-suite (ou C-level) refere-se ao grupo de executivos de mais alto escalão em uma organização. O "C" vem de Chief, o título de várias posições de liderança, como Chief Executive Officer (CEO), Chief Financial Officer (CFO), Chief Operating Officer (COO), entre outros. Esses cargos são geralmente os responsáveis por tomar decisões estratégicas de alto nível e supervisionar a operação da empresa. E endereço acima “address above” é uma expressão inglesa para dizer que não quer ser redundante, que as questões já foram tratadas no texto acima.

Para ver a discussão mais completa no reddit com as fontes, segue Amidst the incompetence of TGC fixing bugs, I checked out the Glassdoor reviews on TGC : r/SkyGame

Apesar disso o Braintrust é uma interessante metodologia, que se eu soubesse da existência nos meus grupos de pesquisa da faculdade, eu teria dado uma chance de colocar em prática. Para saber o passo a passo deixo o link Braintrust da Pixar: sessões de feedback mais enriquecedoras e seguras | by Laís Lara Vacco | UX Collective 🇧🇷. Também há uma palestra do próprio Ed falando sobre o livro Creative Inc. https://youtu.be/ffixfwt654I.

E pra fechar esse post, eu deixo uma fala que me deixou pensativa, vinda da pessoa mais citada aqui, a qual Jenova Chen e a TGC levam em consideração, Ed Catmull: "Você não é sua ideia e, se se identificar muito com suas ideias, ficará ofendido quando desafiado". 

Entrevistas mencionadas ao longo do texto:

Diálogo com Chen Xinghan: No passado, posso ter ficado um pouco "zangado".

"Light Encounter" Chen Xinghan: "Queremos ser a Pixar da indústria do entretenimento interativo"| IGN Brasil

 

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